quarta-feira, 20 de agosto de 2008

O uso e o abuso das escutas telefônicas nas investigações policiais

Assiste-se hoje no Brasil um debate sobre o uso e o abuso das escutas telefônicas nas investigações policiais. A Constituição é clara ao assegurar, como garantia fundamental da privacidade, o sigilo das comunicações telefônicas, exigindo, sempre, que a quebra do sigilo só seja feita em último caso, com autorização judicial, na forma da lei e para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (art. 5º, XII, da Constituição). Deve, por isso, ser repudiado o argumento de que somente é possível haver eficácia nas investigações policiais se houver o uso das escutas telefônicas, sob a falácia de que “quem não deve não teme”, acompanhada da percepção enviesada de que os direitos e garantias fundamentais não podem servir de escudo de proteção para a prática criminosa. A diversidade de posições, na interpretação da Constituição, é bastante comum em regimes democráticos, sendo salutar a sua existência, até para propiciar uma constante renovação de sentido do texto constitucional. Mas, num país com pouca tradição democrática como o Brasil, deve-se ter cuidado com interpretações possíveis da Constituição que possam reduzir, ou até mesmo anular, o sistema de proteção dos direitos humanos, estabelecido pelo reconhecimento de direitos e garantias fundamentais. Daí porque devem ser evitadas interpretações do texto constitucional baseadas numa retórica que procura convencer que os direitos humanos são os “direitos dos bandidos”, que deveriam ceder diante de um interesse maior – que seria o interesse público – de se punir a prática criminosa. Ora, a garantia do sigilo das comunicações telefônicas é essencial ao bom funcionamento do regime democrático, porque decorre da própria proteção da privacidade, afastando do conhecimento público questões que dizem respeito apenas à individualidade das pessoas. Os regimes políticos que permitem ao Estado bisbilhotar indiscriminadamente a vida privada das pessoas são marcados pela ubiqüidade do medo. Esse é um traço característico não só dos Estados Policiais, mas, também, dos Estados Totalitários, que dominam as pessoas em todas as suas esferas, assumindo a posição de verdadeiro Big Brother, como na obra de George Orwell. É por isso que a quebra de sigilo das comunicações telefônicas tem de ser realizada com as cautelas previstas na própria Constituição, devendo ser combatidas, a todo custo, todas as tentativas de se transformar o Estado Brasileiro num Estado de inspiração policialesca ou totalitária.

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